segunda-feira, 13 de agosto de 2012

A depressão (e a hipocrisia) pós-olímpica

Segunda-feira, 13 de agosto de 2012. O dia seguinte ao fim dos Jogos Olímpicos de Londres. Cerimônia de encerramento incrível para um evento igualmente incrível no qual se viu de tudo: um nadador fenomenal; um corredor que parece desafiar o mundo e a si mesmo de forma irreverente e inabalável; heróis olímpicos brasileiros que, sem apoio das confederações, conseguiram feitos históricos; e grandes decepções, com desculpas dos mais variados tipos. E sim, estou oficialmente em depressão pós-olímpica, aquela depressão que bate quando passamos de um momento mágico, em que vemos inúmeras modalidades esportivas passando em praticamente todas as televisões do mundo, para aquele momento em que fica claro que o esforço de atletas como Arthur Zanetti (medalhista de ouro nas argolas), Sarah Menezes (ouro no judô) e os irmãos Falcão (prata e bronze no boxe), cada vez mais, será um evento isolado em relação à hipocrisia que é o apoio ao esporte no Brasil, seja por parte dos Governos Federal, Estaduais e Municipais, das confederações desportivas e até mesmo de uma parcela significativa da imprensa esportiva brasileira.

Sobre o Poder Executivo, não há muito o que ser acrescentado. Todos sabem que não há incentivo para que o esporte vire uma ferramenta de recreação nas escolas de ensino infantil, fundamental e médio. Se isso acontecesse, incentivaria vários jovens a praticarem algum tipo de modalidade esportiva (o que, por si só, já seria um ganho incrível em termos de saúde pública) e, com a devida observação, surgiriam novos talentos para a prática esportiva de alto rendimento, que geraria medalhas olímpicas e títulos mundiais. Mas como o "futuro do pretérito" serve apenas para situações hipotéticas e não se produz atletas olímpicos com chances reais de medalhas em apenas 4 anos, não há uma perspectiva positiva para resultados muito melhores no Rio de Janeiro em 2016.

Sobre as confederações: "nunca na história deste País", houve tanto dinheiro para o esporte (quase R$ 2 bilhões para o ciclo olímpico 2008-2012). Mas os resultados pífios na natação (salvo apenas pela ótima medalha de prata de Thiago Pereira), na ginástica (exceto pelos ótimos, porém pontuais, desempenhos de Sérgio Sasaki e do próprio Zanetti) e, principalmente, no atletismo mostram que todo esse dinheiro foi mal utilizado (como era esperado, visto o caráter duvidoso de gente como Carlos Arthur Nuzman, presidente "quase vitalício" do COB). À exceção do judô, que tem projetos sérios de formação de atletas (e que foi recompensado em Londres), investe-se muito em atletas prontos (e que sobrevivem a um ou, no máximo, dois ciclos olímpicos em alto nível) e esquece-se da base, que é onde esse dinheiro tem que ser investido. E, confirmando essa aberração, o que vemos no Brasil são torneios enferrujados e pouco competitivos, como o Novo Basquete Brasil e o Troféu Brasil de Atletismo, que não serve de parâmetro para preparação nem para o campeonato mundial. Nem a Superliga de vôlei escapa da polarização entre os dois ou três times mais ricos, além das arenas vazias nas fases iniciais, mesmo com atletas de seleção brasileira jogando por aqui.

Sobre a imprensa esportiva brasileira, vimos vários jornalistas (em praticamente todas as emissoras, sites, jornais etc.) cobrando, e com absoluta razão, investimentos no esporte de base, em praticamente todas as categorias, durante os Jogos Olímpicos. Entretanto, menos de 24 horas depois do encerramento dos Jogos Olímpicos, o que se vê na televisão, na internet e nos jornais é o de sempre: um excesso de notícias sobre futebol, a "paixão dos brasileiros". E à medida que o tempo passar, com o retorno dos torneios europeus, a coisa tenderá a piorar, tanto em termos de programação (eu já escrevi umas palavras sobre isso, usando a ESPN Brasil como exemplo) quanto em termos de notícias nos sites, redes sociais e afins. E, cada vez mais, o acompanhamento dos "outros esportes" será restrito a sites especializados e jornalistas que, com valentia, remam contra a maré.

Pode parecer uma besteira enorme, mas tenho cada vez mais convicção de que a imprensa é igualmente culpada pela condição catastrófica na qual vive o esporte brasileiro. Como uma criança ou um jovem terá interesse em praticar outro esporte que não seja o futebol se a televisão não se preocupa em transmitir um torneio de basquete, de vôlei ou do que for e, principalmente, não dá um espaço minimamente razoável para que se discuta estes esportes ou mesmo se dê notícias sobre os mesmos? 

Da poderosa Rede Globo e da Rede Bandeirantes ("eterna parceira" da Globo), não se esperaria algo diferente: sempre fizeram isso e não há perspectiva de mudança. Mas quando a própria ESPN Brasil, salvo raras exceções (eu enumero algumas destas exceções no post anterior), usa do mesmo expediente ao restringir a exibição de jogos dos "outros esportes" por meio da exibição de um número cada vez maior de torneios de futebol ao vivo (e até mesmo em VTs noturnos), além de ter um telejornal que deveria se chamar "SoccerCenter" em vez de "SportsCenter" por causa do espaço excessivo que dá ao futebol; é porque realmente a coisa é complicada. (Eu poderia fazer um outro post descrevendo minha "felicidade" ao ver que a ESPN terá os "poderosos" Campeonatos Grego, Francês e Mexicano em sua programação, mas seria apenas uma repetição do que já escrevi sobre o assunto. E como aqueles que determinam a programação do canal - a saber, João Palomino e, principalmente, Arnaldo Ribeiro, diretor de programação - se preocupam apenas em agradar o fã de futebol, desisto, em definitivo, de fazer outro post.)

Por último, e não menos importante, não posso esquecer de citar a hipocrisia do próprio povo brasileiro, que adora chorar pelos atletas em ano de Jogos Olímpicos, mas durante o ciclo olímpico, esquecerá destes mesmos atletas de forma sumária, como SEMPRE fez. Afinal, quem já foi prestigiar um jogo de basquete do NBB? E da Superliga de vôlei? E um campeonato de judô? Aqui, a imprensa, as confederações e o próprio COB têm igual culpa por não divulgar as outras modalidades, mas o fato é que o brasileiro simplesmente prefere cornetar um desempenho ruim a cada 4 anos a acompanhar a evolução dos atletas. Rosicléia Campos, treinadora do time feminino de judô nos Jogos Olímpicos de Londres, disse uma verdade que incomoda muita gente, mas que resume perfeitamente a situação: o brasileiro é ignorante, no sentido em que ignora o que se passa no judô brasileiro. E aqui, eu estendo a frase para praticamente todos os esportes. Exceto o futebol, que mesmo com todo o dinheiro que movimenta, curiosamente, nunca venceu um torneio olímpico.

O final dos Jogos Olímpicos cria um sentimento de ausência, já que foram 2 semanas incríveis, de competições do mais alto nível e misturando um monte de emoções diferentes a cada momento, seja numa seletiva ou numa cerimônia de pódio. Mas a verdadeira depressão vem ao perceber que pouca coisa mudará em 4 anos e tudo que foi dito, possivelmente, será esquecido e voltaremos à velha rotina. Para reclamarmos da falta de apoio ao esporte olímpico daqui a 4 anos, completando o ciclo da hipocrisia. Uma pena.


Notas rápidas:

  • Quero agradecer a todos pela ótima repercussão que o post anterior gerou. Infelizmente, acho que não adiantará muita coisa pois, como eu disse, cada vez mais João Palomino e Arnaldo Ribeiro se preocupam mais em divulgar futebol europeu em vez de melhorar a qualidade da programação - apesar dos bons profissionais que trabalham na emissora. Mas, pelo menos, essa discussão mostrou que há pessoas que não concordam com a enxurrada de futebol na ESPN Brasil.
  • Um dos pontos positivos na televisão foi a série "Segredos do Esporte", apresentada pelo jornalista Paulo Calçade durante os Jogos Olímpicos na ESPN. A série teve alto nível de discussão sobre aspectos da preparação antes, durante e depois das Olimpíadas, além de uma avaliação crítica do desempenho brasileiro em Londres e o que esperar em 2016.